Um acordo de líderes da base do governo, nesta segunda (6),
pode garantir a votação do projeto, que fora encaminhado ao Congresso pelo
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e havia sido engavetado em 2003,
a pedido do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A tentativa de votação do PL 4302 é uma nova estratégia dos
golpistas, com o objetivo de driblar a resistência do senador Paulo Paim
(PT-RS), relator do PLS 030/2015, que realizou audiências públicas em todos os
estados e elaborou um relatório que impede a terceirização na atividade-fim das
empresas. "É um absurdo, uma irresponsabilidade total”, criticou Paim.
"Chamamos os sindicatos e as federações a enviarem
dirigentes para Brasília, a fim de visitar os gabinetes dos deputados e das
deputadas, mostrando o tremendo retrocesso que esse maldito projeto representa,
uma vez que amplia o trabalho temporário e autoriza a terceirização sem
limites”, afirma o presidente da CUT-RS, Claudir Nespolo. Caso seja aprovado na
Câmara, o texto dependerá apenas de sanção presidencial.
Claudir destaca que, além de fortalecer a pressão no
Congresso, serão feitas manifestações nesta segunda e na madrugada desta terça
no saguão de embarque do Aeroporto Salgado Filho, em Porto Alegre. "Temos que
pressionar os parlamentares para barrar a votação desse projeto nefasto”,
salienta.
"O futuro dos direitos da classe trabalhadora tão durante
conquistados ao longo da história está ameaçado, pois os financiadores do
golpe, como as federações empresariais, estão cobrando a fatura e querem fazer
o trabalhador pagar o pato para aumentar os seus lucros”, denuncia o dirigente
da CUT-RS. "Temos que impedir a precarização do trabalho e o fim dos direitos
trabalhistas”.
A direção nacional da CUT já iniciou uma grande mobilização
em ritmo de urgência e anuncia que vai levar centenas de dirigentes sindicais
até Brasília para debater com os deputados e as deputados. Eles vão alertar
parlamentares de todos os partidos sobre as consequências que o PL 4302 trará à
classe trabalhadora e também para seus projetos eleitorais em 2018.
Reforma trabalhista escancarada
Ao comando de Temer, a Câmara ressuscitou o projeto, que foi
aprovado na Comissão de Constituição e Justiça, com relatoria do deputado
Laercio Oliveira (SD-SE).
Antes, já havia recebido parecer favorável na Comissão de
Trabalho, Administração e Serviço Público do relator, ex-deputado Sandro Mabel
(na época PR-GO), hoje assessor especial de Temer no Palácio do Planalto.
Tanto Oliveira quanto Mabel são empresários. O primeiro é
ex-presidente da Federação Nacional das Empresas Prestadoras de Serviços de
Limpeza Conservação (Febrac), setor em que impera a terceirização, e atualmente
ocupa o cargo de vice-presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC).
Mabel é o famoso dono das bolachas Mabel.
Segundo a CUT, a arapuca armada pela Câmara ataca em duas
frentes: atualmente, a legislação permite que o temporário seja contratado em
caso de "necessidade transitória de substituição” ou "acréscimo extraordinário
de serviços”. Caso em que o trabalhador é afastado por licença ou no comércio
durante o Natal, portanto, em caráter excepcional.
Atualmente, os temporários devem ter asseguradas as mesmas
condições dos empregados permanentes da empresa tomadora de serviço em pontos
como férias, repouso semanal remunerado, adicional por trabalho noturno,
indenização por dispensa sem justa causa ou término normal do contrato.
Na prática, o texto defendido por Temer e aliados propõe a
reforma trabalhista que desejam e põe por terra a legislação atual. O PL
elimina o caráter ‘extraordinário’ da contratação ao aumentar a permissão do
trabalho temporário para seis meses, com possibilidade de até mais 90 dias,
eliminando, portanto, o conceito de temporário.O temporário também não
terá direito à multa de 40% sobre o FGTS e ao aviso prévio em casos de demissão
sem justa causa.
Além disso, autoriza a implementação na atividade-fim da
empresa, a principal, e nas atividades rurais. Na prática, é a terceirização
sem limites, o que permitirá a existência de empresas sem trabalhadores
diretamente vinculados. Atualmente, apenas é permitida a terceirização em
atividades de apoio como limpeza, asseio e vigilância.
Nessa relação entre patrões e trabalhadores, a
responsabilidade deixa de ser solidária e passará a ser subsidiária. No
primeiro modelo, a empresa contratante paga os direitos e salários devidos pela
terceirizada, caso esta desapareça e deixe o trabalhador na mão, caso muito
comum nessa forma de contratação. No segundo caso, o empresário só pagará se a
Justiça assim determinar após longa batalha jurídica.
Traidores
Para a secretária de Relações do Trabalho da CUT, Maria das
Graças Costa, a tramitação do projeto é uma traição por parte dos parlamentares
e representa o desprezo total pela democracia.
"Em dezembro fizemos uma conversa com o Rodrigo Maia (presidente
da Câmara) e com o Eunício Oliveira (presidente do Senado), que se
comprometeram a não colocar em votação o PL 4302 e disseram ser contra
terceirização na atividade-fim. São traidores, inclusive da democracia, porque
não respeitaram as audiências públicas organizadas pelo senador Paulo Paim
(PT-RS), que levou a discussão sobre o PLC 30/2015 – leia mais abaixo – a todo
o país e ouviu por unanimidade a rejeição à terceirização na atividade-fim”,
disse ela.
Para a técnica do Dieese (Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos), Adriana Marcolino, a medida é um tiro
no pé em época de crise.
"Os empresários utilizavam o argumento de que a
terceirização serviria para a empresa se dedicar à atividade principal, mas se
ela ocorre na atividade-fim a justificativa passa a ser somente o lucro em
detrimento dos direitos e condições dignas de trabalho. Os trabalhadores serão
substituídos por outros que ganharão menos, terão menos direitos e trabalharão
mais. Isso não gera emprego e ainda resulta em piores serviços, pior
qualificação e mais acidentes e doenças que serão pagas pelo serviço público
custeado pela sociedade”, aponta a economista.
Mobilização em Brasília
Diante deste cenário, a CUT e integrantes da Frente
Parlamentar em Defesa dos Direitos da Classe Trabalhadora, do Fórum em Defesa
dos Trabalhadores Ameaçados pela Terceirização e doFórum
InterinstitucionaldeDefesa do Direito do Trabalho e da Previdência
Socialse reúnem nesta terça, às 9h30, no Plenário 14 da Câmara para
discutir os ataques aos direitos trabalhistas e visitar os gabinetes de líderes
partidários.
Às 14h, uma audiência pública na Comissão Especial da
Reforma Trabalhista também tratará do tema. A CUT também promoverá uma
mobilização na próxima semana nos gabinetes dos parlamentares para alertar que
serão punidos nas urnas em 2018, caso imponham esse assalto à classe
trabalhadora.
"Não há outro caminho a não ser impedir que esses inimigos
da classe trabalhadora trabalhem na surdina. E só vamos fazer isso se
mostrarmos à sociedade como está sendo roubada”, define Graça.
Luta contra o PLC 030/2015
Antes do PL 4302 entrar em pauta, a CUT e representantes dos
movimentos sindical e sociais lutaram contra o PLC
30/15 que tem origem no PL
4330/2004Â (Projeto de Lei), de autoria do ex-deputado federal Sandro
Mabel (PR-GO), aprovado na Câmara por 324 votos favoráveis contra 137 e duas
abstenções em abril de 2015, sob a truculência do então presidente da Casa,
hoje deputado cassado e preso Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Antiga reivindicação dos empresários para afrouxar a
legislação trabalhista, o texto aprofunda um cenário nocivo à classe
trabalhadora.
Entre os anos de 2015 e 2016, o senador Paulo Paim realizou
audiências públicas em todos os estados para debater o projeto com a sociedade.
Os participantes se manifestaram contra a aprovação desse projeto que precariza
o trabalho e escraviza o trabalhador. Segundo Paim, "o PL 030/2015 representa o
fim da Lei Áurea”.
Segundo o dossiê "Terceirização
e Desenvolvimento, uma conta que não fecha”, lançado em fevereiro deste ano
pela CUT e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos), os terceirizados ganham 25% menos, trabalham quatro horas a
mais e ficam 2,7 anos a menos no emprego quando comparados com os contratados
diretos.
A terceirização favorece ainda situações análogas à
escravidão. O documento aponta que, entre 2010 e 2013, entre os 10 maiores
resgates de trabalhadores escravizados, nove eram terceirizados. *CUT/RS |