Segundo a PED, a região registrou uma taxa de desemprego de 11,3% no
último mês. O estudo aponta ainda uma tendência contínua de "destruição
de empregos”, especialmente aqueles que são considerados como
"protegidos”, ou seja, com carteira de trabalho assinada. "A gente vem
perdendo os empregos mais protegidos, num contexto de recessão. As
poucas ocupações que têm sido geradas nesse último período, têm sido
essas mais precárias, que é o trabalhador autônomo e o emprego
doméstico. O emprego doméstico, na nossa última pesquisa, teve
crescimento e é uma ocupação que vinha em queda”, explica a coordenadora
da PED e economista da FEE, Iracema Castelo Branco.
Na análise do diretor técnico nacional do Dieese (Departamento
Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Clemente Ganz
Lúcio, o cenário de recessão destrói a dinâmica econômica e, com ela, o
emprego. Isso faz com que o cenário de crise atual seja pior do que o
dos anos 1990. Segundo ele, analisando os números atuais, é como se quem
vive hoje na região metropolitana da Capital estivesse vivendo em 2017,
mas com o salário de 1993. Enquanto há duas décadas o problema era
aumento na oferta de mão-de-obra, agora há aumento do número de
trabalhadores sem emprego, ao mesmo tempo em que postos de trabalho
estão sendo eliminados, sem perspectiva de reposição. "Não vemos, no curto prazo, de dois ou três anos, nada que indique
uma mudança desse quadro. Pelo contrário. Isso transforma nosso problema
de desemprego, que aparentemente era conjuntural, em um problema
estrutural. Mais estrutural ainda no quanto que as empresas, ao sair
dessa crise, vão estar inovando tecnologicamente. Se assim o fizerem,
podem estar destruindo mais postos de trabalho. Nós podemos ter uma
dinâmica econômica se recuperando, mas sem a capacidade de gerar o mesmo
número de postos de trabalho que ela destruiu”.
Clemente analisa ainda que o aumento do desemprego no cenário
nacional foi influenciado pelo desemprego no setor da construção civil e
da indústria. No último ano, as taxas aumentaram pelo desemprego em
serviço e comércio. "É uma resposta do mercado do trabalho que, embora
seja ruim do ponto de vista do emprego, é coerente para uma economia que
está em recessão”.
A pesquisa da FEE aponta ainda que há também uma queda "intensa” do
rendimento médio dos salários. O salário médio de 2016 foi o mais baixo
desde que a PED começou a ser registrada, em 1992. "O que significa que,
o aumento da renda e do salário médio que tivemos nestes últimos 10
anos, nós perdemos em dois. Os trabalhadores autônomos têm sofrido muito
mais essa queda do que os trabalhadores assalariados. Se a gente pegar
de 2014 até 2016, a queda que teve em 2015 e a queda que teve em 2016, o
trabalhador assalariado teve uma queda de mais de 15% e o trabalhador
autônomo teve queda de mais de 20% em seu rendimento médio. Esse é o
efeito da crise e da recessão no mercado de trabalho”, diz Iracema.
Estudos recentes da FEE também indicam que, caso o Rio Grande do Sul
tivesse uma população como a da década de 1990 – isto é, com mais jovens
do que idosos – a situação seria ainda pior. "Se a gente tivesse aquele
contexto, da população da década de 1990 para cá, com essa queda nas
ocupações, a gente estaria com uma taxa de desemprego superior a 20%.
Nesse contexto, a crise atual se coloca numa situação ainda mais severa
do que a tínhamos na década de 1990, porque lá gerávamos mais empregos.
Agora, a gente está destruindo os empregos que foram gerados na década
anterior”, explica a economista.
Tudo isso se agrava ainda mais no contexto das reformas trabalhista e
da Previdência Social, apresentadas pelo governo de Michel Temer
(PMDB), no cenário nacional. Enquanto a Previdência pode se tornar ainda
mais frágil com um mercado de trabalho fragilizado, o especialista do
Dieese avalia que a trabalhista pode ter maior impacto. "Ela
é uma reforma silenciosa, porque as pessoas olham e não veem no que ela
está mudando. Mas, no fundo, é uma reforma que altera de forma
estrutural o sistema das relações de trabalho que define as condições de
trabalho e salário. Daqui pra frente, se aprovada essa reforma, nós
teremos condições de legalizar a precarização: o que é hoje precário e
ilegal, será precário e legal. E as empresas poderão reduzir custos
arrochando os salários”, aponta Clemente. A Pesquisa de Emprego e Desemprego da FEE faz parte das políticas
públicas de emprego e sempre serviu como um bússola para o governo do
Estado entender como as mudanças do mercado de trabalho impactavam
diretamente na vida da população. Com dados que são recolhidos
mensalmente em 2.500 municípios da região metropolitana de Porto Alegre,
através de questionários, a PED ainda consegue um fato importante:
traduzir para estatísticas populações que normalmente são marginalizadas
em outras pesquisas, por não terem amostras suficientes.
Porém, com o processo de extinção da FEE, colocada no pacote de
ajuste fiscal enviado pelo governo estadual à Assembleia Legislativa
junto com outras oito fundações, no final do ano passado, uma das
pesquisas regionais mais longevas do país pode estar em seu último ano.
Até o momento, o governo de José Ivo Sartori (PMDB), que destacou a
apresentação da PED-RMPA em seu site oficial, não apresentou formas de como ela seguiria sendo realizada no momento em que a FEE deixar de existir.
"A FEE é uma instituição que sempre foi capaz de dar subsídios para
que o Estado do Rio Grande do Sul pudesse fazer, elaborar políticas, que
de fato pudessem responder à nossa realidade”, afirma Wrana Panizzi,
ex-reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que era
presidente da FEE quando a Pesquisa de Emprego e Desemprego foi criada,
em 1992. "Nós vivíamos, naqueles anos, o fim da década perdida, todo o
avanço tecnológico, tocava muito forte nas nossas relações de trabalho.
As próprias modificações do nosso estado, da nossa região metropolitana,
mostravam que a gente precisava conhecer de forma mais efetiva onde
essas modificações estavam localizadas e como elas se expressavam. Seja
nas relações de trabalho, seja nas relações da formação de alguém
preparado para o trabalho”. Para Iracema, como série histórica, a PED tem auxiliado que se
construa e enxergue um panorama do mercado de trabalho regional. Uma
ferramenta que permite que se compreenda mudanças. "Nos preocupa a gente
estar tendo toda uma discussão de mudança na legislação trabalhista e
aí interromper uma pesquisa como essa, que é de longo prazo, que não vai
dar conta de analisar e ver o impacto disso no mercado de trabalho e na
vida das pessoas”.
Algo reiterado pelo diretor do Dieese. "O Estado brasileiro vive
graves crises fiscais e precisam ser respondidas com três dinâmicas. A
primeira é crescimento, a economia precisa crescer senão o Estado
arrecada menos. Segundo, reforma fiscal e tributária, precisa arrecadar
mais e melhor. E o terceiro, a modernização do Estado. Mas tudo isso,
fortalecendo as instituições. Não creio que uma decisão de fechar uma
instituição como a FEE seja uma decisão inteligente”, salienta Clemente
Ganz. "Um Estado como o Rio Grande do Sul, que tem a importância
econômica que tem, tem que ter seus instrumentos para fazer uma leitura
da realidade e tomar decisões de política econômica, política social,
desenvolvimento, coerente com a realidade dessa população”. *Sul21 |