Uma nova onda de mudanças tecnológicas integra
plataformas de produção de bens e serviços em âmbito global e acelera as
mudanças. A tecnologia substitui, em quantidades inimagináveis, a força de
trabalho humana, desempregando e submetendo os trabalhadores à precarização,
insegurança, ansiedade, pobreza, ao desespero e a outros tipos de mazelas ainda
desconhecidas.
Na vida política, as democracias cada vez
mais são entendidas pelo mercado como um mal necessário, a ser limitado. As
instituições são sistematicamente fragilizadas, controladas e induzidas para resultados
esperados pelo mercado; os poderes Executivo e Legislativo, submetidos ao
controle do dinheiro, enquanto o Judiciário é animado a ser o vigilante
garantidor da propriedade, dos valores e direitos do capital. Há liberdade para
consentir, há repressão se divergir e, se necessário, eliminam-se oposições. A política
se curva ao deus dinheiro.
Os meios de comunicação e as redes sociais
espalham ideias, valores e induzem comportamentos. As classes médias, serviçais
ideológicas dos ricos, exprimem o ódio aos pobres, negros, imigrantes e a todos
os excluídos.
O Brasil se integrou plenamente neste
jogo. Simultaneamente, realizam-se no país enormes transferências das riquezas
naturais e empresas, estatais e privadas, ao capital internacional. Uma
desnacionalização em magnitude desconhecida no mundo capitalista se opera em
meses, esquartejando empresas, desprotegendo reservas naturais, abrindo espaço
aéreo e marítimo, enfim, vendendo barato, cedendo, tudo feito para o bom e
livre funcionamento do mercado. Silenciosa, essa operação de ataque ao país
acontece enquanto parte da nação desconhece o que ocorre e a outra olha atônita,
sem acreditar no que vê.
Nesse movimento, a mudança constitucional,
que colocou limites aos gastos públicos federais, promete deixar o estado reduzido
à metade, em 20 anos, definindo por duas décadas o espaço fiscal da democracia
e do voto!
O programa de desestatização é financiado
com dinheiro público, por meio do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social). As imensas dividas das empresas com impostos são
perdoadas. A grave crise econômica coloca os patrimônios produtivos à venda a
preço de banana. Terras, minérios, água potável e florestas oferecidos a
estrangeiros. Investidores, empresas privadas e estatais do mundo inteiro adquirem
por precinho módico riquezas únicas!
Recentemente, em mais um lance ousado,
Legislativo e Executivo transformaram profundamente a legislação trabalhista. A
lei deixou de ser um sistema protetor dos trabalhadores para passar a proteger
as empresas.
A reforma alterou a hierarquia normativa em
que Constituição, legislação, convenções coletivas e acordos eram pisos
progressivos de direito. A partir de agora, a Constituição passa a ser um teto,
a legislação, uma referência de direitos que poderão ser reduzidos pelas
convenções; os acordos poderão diminuir garantias previstas em leis e
convenções e; o indivíduo poderá abrir mão de muito do que foi conquistado a
duras penas. Os trabalhadores e os sindicatos "ganharam o livre direito” para
reduzir salários, garantias, flexibilizar contratos, ampliar ou reduzir
jornada, quitar definitivamente, na presença coercitiva do empregador, os
direitos. O acesso dos trabalhadores à justiça foi limitado. Já as empresas ganharam
inúmeros instrumentos que dão a máxima garantia e proteção jurídica e estão
livres e seguras para ajustar o custo do trabalho.
São parte das mudanças vários novos contratos
de trabalho (tempo parcial, trabalho temporário, trabalho intermitente,
autônomo exclusivo, terceirizado sem limite, teletrabalho) que permitem ajustar
o volume de trabalho à produção no dia, na semana, no mês, ao longo do ano.
Esses contratos podem ter ampla flexibilização em termos de jornada (duração,
intervalos, férias, banco de horas etc.). As definições do que é salário são
alteradas e os valores podem ser reduzidos, assim como outras obrigações
legais. A demissão é facilitada, inclusive a coletiva, com formas diversas de
quitação definitiva de débitos trabalhistas.
O poder de negociação dos sindicatos é
fragilizado, com o "novo poder” de reduzir direitos, a interposição de comissões
de representação dos trabalhadores, nas quais é proibida a participação
sindical, ou com o empoderamento do indivíduo para negociar diretamente, medidas
que, enfim, quebram o papel sindical de escudo coletivo e protetor. Como já
ocorre em outros países que adotam mecanismos semelhantes, os trabalhadores serão
incentivados e estimulados, por meio de inúmeras práticas antissindicais e de submissão
patronal, a não apoiar ou financiar os sindicatos. Ficarão submetidos ao poder
das empresas, pressionados para aceitar acordos espúrios diante do medo de
perder o emprego.
A justiça do trabalho, que agora será paga,
terá sua tarefa reduzida à análise formal dos pleitos. A lei criou uma tabela
que precifica o ônus da empresa até, no máximo, 50 vezes o salário do
trabalhador!
São mais de 300 alterações na legislação
trabalhista operando um verdadeiro ataque aos trabalhadores. A reforma
trabalhista brasileira é um exemplo extremo, comparada a outras 640 realizadas
em 110 países entre 2008 a 2014.
Mas a vida em sociedade tem caráter de um
jogo em aberto, que exige fôlego para continuar permanentemente correndo e
lutando para mudar o resultado. A história mostra que os oprimidos e derrotados
constroem suas respostas, sempre!
Não há outro caminho que não seja o da
resistência em todas as frentes. Será preciso unir os que discordam da maldade
embutida nas reformas e na opção colonialista de entrega da soberania nacional.
Essa nova legislação ampliará os conflitos
trabalhistas e, provavelmente, os sociais. E, depois de deflagrados, será
difícil contê-los.
O projeto que sustenta essa reforma
trabalhista é social e politicamente medíocre, porque desconsidera que o
processo civilizatório, no capitalismo, significou a estruturação de um mercado
regulado na produção e distribuição dos resultados por instituições fortes,
diálogo social e organizações representativas. |