De modo geral, as previsões não são nada otimistas. O
mercado projeta que o Produto Interno Bruto (PIB) cresça apenas 0,5% em 2017. A
professora Esther Dweck,do Instituto de Economia da Universidade Federal
do Rio de Janeiro (UFRJ), e secretária de Orçamento Federal entre 2015 e
2016avalia que orisco de o Brasil viver uma situação similar à
vivida pela Grécia é real. "Não estou nem um pouco otimista. Se o país
crescer 0,5% este ano, o desemprego aumenta. Precisa crescer 2%, 3% para ter uma
queda de desemprego razoável. A Grécia foi proibida de fazer política
anticíclica pela Troika (União Europeia, Banco Central Europeu e Fundo
Monetário Internacional). No nosso caso, estamos abrindo mão pelas políticas de
destruição do nosso sistema de bem-estar social e da indução do
desenvolvimento".
Entre outras consequências, os oito anos de austeridade
fiscal imposta pelo sistema financeiro à Grécia levou a uma redução de cerca de
30% do PIB do país. Com isso, o desemprego está há cinco anos acima dos 20%,
com impacto dramático sobre os mais jovens – 44% dos gregos até 24 anos.
"No médio prazo, medidas como a PEC que estabelece
limites aos gastos públicos e a reforma da Previdência, tendem a eliminar o
'colchão', a rede de proteção social que, no Brasil, é bastante consolidada
para um país em desenvolvimento, apesar de pequena em comparação com países
desenvolvidos", diz Esther. "Eliminado esse 'colchão', o país fica
mais vulnerável a convulsões sociais em caso de crise econômica, como a de
agora."
Emblemático é o caso do Bolsa Família. O programa beneficia
cerca de 14 milhões de famílias no país, foi importante não apenas como parte
da "rede de proteção" como ajudou a movimentar a economia do país,
mas foi estigmatizado por setores da população como "bolsa esmola". O
governo Michel Temer parece estar de acordo com esses últimos. Embora não
admita que quer diminuí-lo, está tentando acabar com uma das lógicas do
programa, que fazia uma avaliação sobre se a simples saída da chamada
"linha de pobreza" é motivo imediato da saída do beneficiário do
Bolsa Família.
Para o governo atual, se a pessoa saiu da linha da pobreza,
tem que deixar o programa. Mas essa política é uma das que subvertem sua
lógica. "Quem está muito perto da linha da pobreza pode ter algum revés,
perder a renda e precisar continuar no benefício. Havia um mecanismo mais
sensível a quem está nesse limiar. O governo quer acabar com isso porque diz
que a pessoa recebe assistência indevida, quando na verdade é uma preocupação com
as flutuações de renda que acontecem com qualquer um", diz Esther.
Esse é apenas um exemplo. Na verdade, o que é mais urgente é
a recuperação da economia. "Mas para isso é preciso que se tomem medidas
concretas de retomada do crescimento, e também de medidas distributivas. Este
ano o salário mínimo não teve aumento real. O Bolsa Família teve um aumento no
ano passado, mas neste ano não foi anunciado nada."
A economista entende ainda que outras iniciativas poderiam
ajudar a estender a proteção aos cidadãos atingidos no momento de crise. Por
exemplo, a ampliação das parcelas do seguro desemprego, como foi feito em
momentos de crise no passado, como em 2009. Outro exemplo: a devolução, pelo
BNDES, de R$100 bilhõesao Tesouro Nacional em janeiro,dinheiro
que poderia estar sendo usado para o investimento e o crescimento, inclusive no
seguro-desemprego.
"Numa faixa no limiar da linha da pobreza, a pessoa
fica muito mais exposta à crise com qualquer revés, por isso precisamos de mais
mecanismos de proteção. Como todas as ações estão sendo feitas para tirar o que
tem, e não para ampliar, a situação tende a ser bastante preocupante."
Crises nos estados
Enquanto isso, as crises nos estados pouco a pouco vão
pipocando, como no Espírito Santo e no Rio de Janeiro. A economista ressalta
que existem particularidades nos estados, mas aqueda de arrecadação em todo o
país agrava as situações locais. "O Espírito Santo é emblemático,
porque de fato os policiais ficaram anos sem reajuste. Isso claramente tem
ligação com o ajuste fiscal forte feito no estado (pelo governador Paulo
Hartung, do PSDB)."
Já no Rio há o movimento dos servidores, que, como lembra a
economista, estão pagando a conta decorrente da enorme queda de
arrecadação com a baixa dos preços do petróleo, já que a receita do estado é
muito dependente dos royalties (o Espírito Santo também, embora em menor grau).
"Em todos os estados e municípios está havendo queda de arrecadação muito
forte. Com cada vez mais cortes nos gastos, vamos indo cada vez mais para o
buraco", conclui a professora da UFRJ.
Ironicamente, em sua página da internet, o Banco Mundial,
que não é nenhum organismo marxista, diz o seguinte sobre o Brasil: "Entre
2003 e 2014, o Brasil viveu uma fase de progresso econômico e social em que
mais de 29 milhões de pessoas saíram da pobreza e a desigualdade diminuiu
expressivamente (o coeficiente de Gini caiu 6,6% no mesmo período, de 58,1 para
51,5). O nível de renda dos 40% mais pobres da população aumentou, em média,
7,1% (em termos reais) entre 2003 e 2014, em comparação ao crescimento de renda
de 4,4% observado na população geral. No entanto, desde 2015 o ritmo de redução
da pobreza e da desigualdade parece ter estagnado". *RBA |