Artigo | 14/04/2015 | 11:04:22
Terceirização blinda patrimônio de empresas e precariza trabalho
Precarizar representa aumentar margens de lucro
 

Não vou repetir dados concretos de que a terceirização precariza as relações de trabalho e é responsável pelos maiores índices de acidente de trabalho no Brasil. Quero chamar a atenção do leitor sobre a posição dos agentes sociais que concentram o poder na sociedade brasileira: empresariado, governo, sindicatos e imprensa.


A partir disso, compreenderão tranquilamente porque essa barbárie será aprovada. Todos têm um ponto em comum: dinheiro. A grana convence os mais singelos puritanos.

Precarizar condições de trabalho representa aumentar margens de lucros dos empresários. Em um país com taxa de desemprego não muito alta (7,4% segundo última PNAD, do IBGE) e mão-de-obra desqualificada (por deficiência na educação), a baixa oferta encarece o mercado. Diminuir os direitos do trabalhadores é meio hábil a cumprir esse objetivo.

O governo reservou sua parte: incluiu no projeto de lei os recolhimentos tributários diretamente pela empresa contratante. Ninguém suporia que, além do trabalhador, o governo quisesse receber diretamente das empresas prestadoras de serviços. Afinal, a maioria dessas empresas são fachadas sem qualquer lastro patrimonial.

Os trabalhadores – representados por um sistema sindical ditatorial criado pelo Estado Novo de Getúlio Vargas, que impõe um único representante por categoria (unicidade sindical) e contribuição sindical compulsórios – são reféns de uma partilha prevista na lei, que deixaria os royalties do petróleo com inveja.

Construíram um retalho inédito no direito brasileiro: o sindicato da atividade do trabalhador recebe as contribuições, mas o trabalhador não recebe os direitos negociados por esse sindicato (porque recebe o direito do sindicato terceirizado). É quase um estelionato: você paga, mas não recebe. Fácil entender, portanto, a divergência de centrais sindicais sobre o tema. Fosse à época em que o movimento organizado dos trabalhadores não era governo, nem sei o que ocorreria no Brasil.

A imprensa também está no páreo. Quem milita na Justiça do Trabalho sabe que, há tempos, são raros os empregados registrados no setor. O fenômeno da "pejotização" (neologismo de contratação por pessoas jurídicas abertas pelo próprio trabalhador) invadiu todos os meios de comunicações. A terceirização cai como uma luva para legalizar a precarização que há tempos praticam. Sabe-se de setores que nem querem publicar sobre esse assunto.

O resultado da malfadada lei será claro. Uma cadeia infindável de terceirizações (quarteirizações, quinteirizações etc.) desconhecida pelo trabalhador, para blindar o patrimônio da contratante, sob a conhecida alegação trazida na Justiça do Trabalho: "desconheço o trabalhador e não tenho contrato com seu empregador". O "João sem braço" manipula o ônus da prova para competir ao trabalhador provar sobre a prestação de serviços e a existência da cadeia de terceirização.

Sobrará, mais uma vez, a esperança do trabalhador brasileiro no Poder Judiciário, algo inconcebível em uma democracia moderna. No âmbito da Justiça do Trabalho, anotem aí: mesmo que tentem arrebentá-la pelo inevitável furacão de processos que virá, estaremos prontos a cumprir nosso papel constitucional.

Haverá um dia em que veremos no Brasil: "Não quero dinheiro. Quero amor sincero. Isto é que eu espero". Atualmente, só nos resta chamar o síndico, Tim Maia! Infelizmente, não se espera que ele esteja no Senado, ora formado por campanhas eleitorais financiadas por grandes empresas.

*Farley Roberto R. de C. Ferreira
Especial para o UOL