"Temos a terceira maior população carcerária do mundo.
Prender não resolveu nada para enfrentar a situação de violência em que
sociedade se encontra hoje. Estamos tratando de quase metade da população
brasileira. Essa Casa deve ter noção da responsabilidade com que está lidando”,
afirmou a presidenta do Conjuve, Ângela Guimarães, em coletiva das entidades na
manhã de hoje (30).
Para ela, os deputados deviam "centrar fogo” na Comissão
Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o assassinato de jovens, aprovada recentemente.
"O Brasil é um país onde é muito perigoso ser criança ou jovem. Temos
legislações avançadas, mas é preciso efetivá-las. O que está sendo proposto
pela CCJ é um futuro de barbárie contra crianças e jovens”, disse Ângela, que
considera parte da imprensa responsável pela visão "estereotipada” sobre
crianças e adolescentes no Brasil.
Representantes das entidades vão procurar os parlamentares
membros da CCJ para tentar convencê-los a votar contra a proposta, que
consideram ilegal e ineficaz. "Aprovar a PEC não vai reduzir a violência, nem
enfrentar as suas causas. Mas desviaria o foco do problema real que é garantir
as políticas públicas preconizadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente,
que nunca foram efetivadas”, defendeu a presidenta do Conselho Federal de
Psicologia (CFP), Mariza Monteiro Borges.
Mariza lembrou que ao longo da história do Brasil, crianças
e adolescentes não eram tratados como sujeitos de direitos. Somente com a
promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), há 25 anos, é que
foi definida uma diretriz sobre a qual as políticas públicas voltadas a eles
deviam ser desenvolvidas. "Devemos garantir direitos e não extirpá-los do
convívio social”, concluiu.
Na última quarta-feira (25), o presidente da CCJ da Câmara,
Arthur Lira (PP-AL), decidiu que vai colocar a PEC 171 em pauta como item único
em todas as sessões extraordinárias, até que a admissibilidade do projeto seja
votada. A primeira sessão será hoje (30), às 14h. "Vai ter tempo para discutir
o projeto na comissão especial da Câmara, depois nas duas votações na Câmara,
mais a comissão especial no Senado, mais as duas votações”, disse Lira aos
deputados e manifestantes que queriam mais tempo para debater a PEC.
A presidenta da União Brasileira de Estudantes Secundaristas
(Ubes), Bárbara Melo, disse que a entidade vai se mobilizar em todo o país
contra a PEC 171. "Essa medida é contra a sociedade. É um crime contra toda a
juventude. Precisamos de uma pátria educadora de fato e não encarceradora. A
maior parte dos crimes hediondos não são cometidos por jovens”, afirmou.
De acordo com dados do Censo do Sistema Único de Assistência
Social, elaborado em 2014, o Brasil tinha 108.554 adolescentes cumprindo algum
tipo de medida socioeducativa em 2012. O número corresponde a 0,18% dos 60
milhões de brasileiros com menos de 18 anos. Destes, 20.532 (19%) cumpriam
medida de internação ou semiliberdade e 88.022 (81%) estavam em prestação de
serviços à comunidade ou sob liberdade assistida.
No entanto, os atos contra a vida registrados eram 13,3% do
total de atos infracionais, sendo homicídios, 9%, latrocínio, 2,1%, estupro,
1,4% e lesão corporal, 0,8%. A prática de roubo respondeu por 38,6% dos casos e
o tráfico de drogas, por 27%.
Para a professora de psicologia Flávia Lemos, a redução da
maioridade penal vai punir duplamente os adolescentes. "Essa lógica penal
proposta pela PEC, além de ilegal, é um crime. Nós estamos falando de crianças
e adolescentes que nunca foram prioridades na atenção dos governos, mesmo
depois da aprovação do ECA. Já os punimos sem garantir os direitos. E agora
vamos jogá-los na cadeia”, questionou.
Também participam da mobilização de hoje representantes da
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), do Conselho Federal de
Serviço Social (CFESS), da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do
Ministério Público Federal (MPF), da Associação dos Juízes pela Democracia
(AJD), da Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas), da Associação
Nacional dos Centros de Defesa da Criança e do Adolescente (Anced), da Rede
Nacional do Adolescente em Conflito com a Lei (Renade) e da Associação Nacional
dos Defensores Públicos (Anadep). *RBA
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