Professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro
de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho da Unicamp, Eduardo Fagnani atacou
a política macroeconômica do governo interino de Michel Temer (PMDB-SP), que
ele chama de "impeachment do processo civilizatório", pautada na
austeridade fracassada na Europa, com redução de direitos sociais e
trabalhistas e privatização das poucas empresas públicas que sobraram.
"Uma receita que o próprio FMI condena por não reduzir as desigualdades.
Não dá para aceitar a tese ou consenso de que sem acabar com a Constituição não
se faz ajuste", disse.
De acordo com Fagnani, as desigualdades sociais forjadas
pelos 300 anos de escravidão, pelo atraso de anos de democracia interrompida e
agravadas pela reforma neoliberal de FHC, que atacou a Constituição, tornam o
projeto de reforma previdenciária de Temer ainda mais perverso, injusto e cheio
de distorções.
"Querem que todo mundo se aposente com mais de 65 anos
de idade, com mais de 35 anos de contribuição, o que não existe em nenhum lugar
do mundo. Não dá para ter o mesmo padrão de países feito a Dinamarca, onde as
condições de vida são muito melhores para toda a população, que vive em média 8
anos a mais que os brasileiros. No Brasil, a maioria da população começa a
trabalhar cedo, sem estudo, para ajudar a família, em empregos de baixa
qualidade. Não tem as mesmas condições de vida e de saúde da classe média, que
ingressa mais tarde no mercado de trabalho, em postos mais elevados, com
melhores salários", disse.
O professor da Unicamp criticou também a proposta do governo
interino de acabar com as regras diferenciadas para os trabalhadores rurais e
urbanos e com a correção com base na variação do salário mínimo. "A maior
parte da pobreza do país está na zona rural do nordeste brasileiro, onde há
cinco estados que a população vive em média 69 anos. É grande a desigualdade.
Como podemos aceitar? É verdade que em alguns anos a maior parcela da população
será idosa, mas não podemos aceitar o fatalismo demográfico. Existem
alternativas para viabilizar aposentadorias. Com tantos ataques (pelo governo
Temer), o Brasil tende a retroceder 100 anos, indo para uma época anterior à da
criação da CLT."
No seu entender, a Previdência carece de aperfeiçoamento,
como buscam as reformas previdenciárias em outros países. "É normal que se
faça reforma da Previdência, com mudanças para aperfeiçoamento, mas não uma
reforma como pretende o governo Temer, que destrua o sistema
querepresenta proteção para pelo menos 160 milhões de pessoas. O que está
em disputa aqui é capturar um orçamento que corresponde a 8% do PIB",
destacou.
Ele mencionou alternativas como a criação de um fundo a
partir de recursos do petróleo, como foi feito na Noruega, e ressaltou a
necessidade de reforma tributária com o fim de isenções fiscais e o combate à
sonegação de impostos. "No Brasil são mais de 60 setores isentos de
contribuição, como igrejas e clubes, o que representa 25% de tudo que a União
recebe. Em termos de sonegação de impostos, só perdemos para a Rússia",
afirmou, lembrando distorções tributárias que cobram imposto de renda sobre o
salário dos trabalhadores mas isentam proprietários de iates –, bem como
o combate à sonegação.
Fagnani participou de debate mediado pelo jornalista Luís
Nassif, que discutiu ameaças à seguridade social. A mesa contou com a presença
do advogado especialista em previdência e assessor sindical Antonio José Arruda
Rebouças.
Sem desprezar a desigualdade de forças na disputa que
envolve a reforma previdenciária, Rebouças destacou que a desvantagem dos
trabalhadores deve ser enfrentada com maior presença dos sindicatos. "Ao
contrário dos patrões, os sindicatos não vão às cortes supremas da Justiça e
nem à imprensa. É preciso ir às ruas, às redes sociais e denunciar à população.
Sem informação, a população não vai ter consciência dos fatos", disse.
O advogado destacou ainda ataques já em curso na
Previdência, como o cada vez mais comum cancelamento de benefícios para
trabalhadores. *RBA |