Esse topo da pirâmide social totalizou rendimentos de R$ 298
bilhões e possui patrimônio de R$ 1,2 trilhão. É tanta riqueza que faz com que
essas 71 mil pessoas, que não passam de 0,05% da população economicamente
ativa, sejam donas de quase 22% das propriedades, bens e ativos financeiros
declarados. Somadas com os outros 136 mil brasileiros com renda acima de 80
salários mínimos por mês, essa elite passa a ser dona de 30% da riqueza no
Brasil.
Injustiça tributária
A divulgação desses dados é uma ação inédita do governo.
Além de demonstrar a desigualdade de renda, os números denunciam também a
injustiça tributária praticada no país. Para se ter uma ideia, essa camada mais
rica tem 6,4% de sua renda retida na fonte pela Receita, em média. Já os
extratos intermediários, gente que tem rendimentos anuais entre 20 e 40
salários mínimos (R$ 162.420 e R$ 325.440) pagam 11,7% de imposto retido na
fonte. No caso do imposto de renda, ele só é progressivo até uma determinada
faixa de renda. Quem recebe acima de R$ 4.664 por mês, paga a mesma alíquota de
que ganha R$ 10 mil, R$ 50 mil ou R$ 300 mil mensais.
Além disso, a isenção tributária privilegia os mais ricos,
já que boa parte dos bens e ativos não recolhem impostos. Um dos exemplos mais
clássicos é a isenção para bens de luxo, como iates e aeronaves. Outro
flagrante é a não tributação de lucros e dividendos recebidos por acionistas e
sócios de empresas. Esse privilégio foi assegurado em 1996, durante o governo
Fernando Henrique Cardoso (PSDB), sob o argumento de que o lucro já era
tributado ao nível da empresa e não poderia ser taxado duas vezes. Ocorre que,
entre as 34 nações desenvolvidas que da Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico (OCDE), apenas a Estônia garante essa isenção. Como
resultado desse esquema, cerca de 40% da carga tributária brasileira,
atualmente, é composta por impostos indiretos, que são aqueles embutidos nos
produtos de consumo, que acabam pesando no bolso dos mais pobres. A população
de baixa renda e as classes médias comprometem 32,8% dos seus rendimentos com
impostos, enquanto os 10% mais ricos gastam 22,7% da sua renda com tributos.
Para o economista Rodrigo Orair, do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea), as informações sobre imposto de renda demonstram que
a desigualdade é ainda muito maior do se pensa no Brasil. "O grande problema é
a tributação do consumo, que compromete quase tudo que os mais pobres ganham, e
a profunda a diferença com os mais ricos”, analisa.
Países ricos taxam os seus riscos
O Brasil vai na contramão da maioria dos países mais ricos e
desenvolvidos do mundo. Em média, a tributação total da renda representa, em
termos de carga tributária, 57% do total nos Estados Unidos, 64% na França e
48% na Alemanha. Significa que, proporcionalmente, os mais ricos pagam mais
impostos e os mais pobres pagam menos. Nesses mesmos países, a carga tributária
sobre a produção e consumo, que é igualmente paga por ricos e pobres através
dos produtos, e não passa de 18% nos EUA ou de 25%, na França. Já no Brasil,
corresponde a mais da metade. Por outro lado, o imposto sobre os rendimentos é
tímido em nosso país, não ultrapassa 35% da carga tributária.
"As pessoas reclamam de ter que pagar imposto de renda,
IPTU, IPVA, mas não vê que tá pagando muito mais de ICMS, IPI, Cofins, de forma
invisível sobre o consumo”, exemplifica Rodrigo Orair, economista do Ipea. Isso
afeta também a competividade da economia, pois tornam os custos de produção e,
consequentemente, dos produtos, muito mais caros no mercado brasileiro,
penalizando a população mais pobre.
Grandes fortunas
Mestre em Finanças Públicas e ex-secretário de Finanças da
prefeitura de São Paulo, Amir Khair propõe o imposto sobre grandes fortunas
(IGF), como uma das formas de fazer justiça tributária e aliviar os impostos
que incidem sobre os mais pobres. Em entrevista concedida à revista Carta
Capital, Khair estipulou que o governo poderia arrecadar mais de R$ 100 bilhões
de reais em impostos se implantasse a taxação das grandes fortunas. Esse valor
é muito superior ao que o governo Dilma quer economizar esse ano (cerca de R$
66 bilhões) como parte do ajuste fiscal.
Na avaliação do economista, se os patrimônios acima de R$ 1
milhão fossem taxados (com uma alíquota baixa, de até 1%), no máximo 5% da
população brasileira seria atingida e, como resultado, o governo poderia
aliviar a carga tributária sobre o consumo, que no Brasil é uma das mais altas
do mundo. "Quando você tem uma tributação mais equilibrada, como nos países
desenvolvidos, essa tributação sobre o consumo não excede 30%, e você tem bens
a preços melhores para o consumo da população”, analisa.
*Brasil de Fato
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